domingo, 20 de março de 2016

Nath Escritora #02 - Restaurante



O Restaurante é um cenário de um sonho que costumava ser recorrente para mim. Já sonhei com este lugar dezenas de vezes, mas nos últimos anos não me lembro de ter sonhado. Quando eu tinha meus 12 anos e estava começando a produzir minhas primeiras ideias para livros, me lembro de ter inspirado um livro, que na época se chamaria "Intenso", que teria esse Restaurante como um lugar mágico. Mais tarde, acabei acoplando essa ideia à minha série principal de livros, "O Anjo de Vidro". Essa história que era "Intenso" ainda não tem um nome novo, mas é legal pensar que surgiu antes e foi adicionada ao universo de uma ideia que eu só fui ter muito tempo depois.
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Tudo o que existia para todos os lados era a grama alta e de um tom tão intenso de verde que era quase azul. Acima, o céu tinha a cor mais impossível de violeta, com duas luas douradas e idênticas suspensas no firmamento. Ambas as luas estavam no seu período crescente, e nenhuma estrela, ou fantasma de estrela, era visível dali.

Levantei-me, mas não sentia meu corpo de verdade. Eu parecia feita de fumaça, de vento, de nada. Por ser vento, voei livremente, sem realmente me importar com cansaço ou possíveis perigos. Tudo o que havia ali era grama e céu, e o mundo parecia tão jovem que ainda respirava, e eu era o ar do qual ele precisava.

Depois de tanto tempo vagando pelo gramado infinito, quando as luas já não estavam mais no céu e o mesmo era avermelhado, pude ver algo. Parecia uma mancha, uma escuridão no meio de todo um universo perfeito. Ao me aproximar percebi que a mancha de escuridão tinha um formato: uma enorme construção de pedra e gesso, vidro e madeira. Tudo aquilo parecia muito antigo, em ruínas, secular. A construção era um enorme restaurante, com um terraço amplo feito de pedra escura. As mesas eram de pedra e saiam direto do chão, e estavam quebradas e empoeiradas. Não havia cadeiras, apenas pedaços de madeira escura, provavelmente queimada, espalhados por todo lado. Teias de aranha cresciam nos lugares mais improváveis, e cacos de vidro colorido cobriam o chão, como se tivessem caído do céu em forma de chuva brilhante.

Após explorar o lugar percebi que havia uma entrada para a construção, que eu não havia reparado antes. Era uma entrada larga, sem porta, apenas coberta com uma manta púrpura. Afastei a manta e entrei no restaurante.

Não havia nada ali, exceto uma escuridão profunda. Tentei encontrar a manta novamente, mas não conseguia tocar nada. O chão era frio e estava molhado, e não havia mais nada por ali. Corri por todos os cantos, mas parecia não haver saída. Era tão escuro que eu não podia ver sequer um palmo à minha frente. Tudo o que eu conseguia captar com meus sentidos era um som pulsante de água corrente.

Foi então que percebi que o chão não estava apenas levemente molhado, mas o nível da água estava subindo. Antes a água estava apenas em meus pés, mas agora chegava em meus calcanhares. E então, eu vi uma luz.

Era uma luz tímida e bege, distante e quase se apagando. Corri até ela. Logo percebi que era uma pequena vela que flutuava na água, e várias outras velas iguais começaram a aparecer, traçando um caminho pela escuridão.

Segui o caminho até uma escadaria, que parecia uma pequena cachoeira de camadas. Desci a escada a passos curtos, com medo de cair, ignorando o fato de que a água ali não parecia seguir as leis da gravidade, e subia os degraus ao invés de descer. Por algum motivo, eu não podia mais voar.

Ao chegar no fim da escadaria eu podia sentir a presença de mais pessoas. Subitamente, as luzes se ascenderam e eu estava flutuando, como se estivesse pendurada no centro de uma sala sem teto ou chão. A escadaria havia sumido, e tudo o que restava eram longas paredes marrons infinitas, como se eu estivesse suspensa no centro de um poço de elevador, só que muito mais largo do que deveria ser.

         Uma figura masculina, sem idade definida e com o corpo completamente azul, surgiu na minha frente.

         Tentei abrir a boca para perguntar algo, mas não consegui. Parecia que meus lábios estavam costurados. Mas não entrei em pânico, pois o rosto do homem à minha frente era tão calmo que eu só conseguia pensar em coisas boas. Ele estendeu a mão para mim e eu a segurei. Era quente e viva, e eu soube que podia confiar nele.

         Ele me guiou em direção à parede leste, onde percebi que havia uma porta, da mesma cor da parede. Ele me olhou com a expressão fechada, como se estivesse me advertindo do que eu veria a seguir. Assenti, e um sorriso maroto surgiu no rosto dele.

         Mas nada poderia ter me preparado para o que viria a seguir. A nova sala era pequena, como um banheiro compacto. As paredes eram de azulejos brancos e lustrosos, e no chão havia uma massa ensanguentada.

         Milhares de pequenos vermes e insetos corriam para todos os lados. Eles eram completamente negros e o sangue que os cobria fazia com que cintilassem em vermelho. Eles se amontoavam como se estivessem numa disputa por algo.

         Olhei para o homem ao meu lado, mas ele continuava com o olhar fixo nos vermes. Deve ter sentido meu olhar sobre ele, pois apontou para os vermes novamente. Olhei.

         Eles disputavam por algo, de fato.

         Alimento.

        Alguém estava ali no chão, morto. Estava de costas e tinha longos cabelos castanhos, com os fios ensopados de sangue. A pele era muito pálida e meio comida pelos vermes, e sangue ensopava cada centímetro do tronco e costas da figura. Parecia uma mulher.

         De repente, o homem de pele azul colocou sua mão esquerda no meu ombro. Não estava mais quente, mas sim fria como gelo. Olhei para ele, e sua pele parecia ter clareado uns 10 tons, pois agora era de um azul pastel gélido e doentio. O homem sorria, com sua boca cheia de dentes, mais do que deveriam, e apontava com veemência pra o corpo.



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